O Globo
Publicado em 10/08/2012
Nina e Carminha em Brasília
Nelson Motta
Se o mensalão não tivesse existido, ou se não fosse descoberto, ou se
Roberto Jefferson não o denunciasse, muito provavelmente não seria
Dilma, mas Zé Dirceu o ocupante do Palácio da Alvorada, de onde
certamente nunca mais sairia. Roberto Jefferson tem todos os motivos
para exigir seu crédito e nossa eterna gratidão por seu feito heroico:
"Eu salvei o Brasil do Zé Dirceu." Em 2005, Dirceu dominava o governo
e o PT, tinha Lula na mão, era o candidato natural à sua sucessão. E
passaria como um trator sobre quem ousasse se opor à sua missão
histórica. Sua companheira de armas Dilma Rousseff poderia ser, no
máximo, sua chefe da Casa Civil, ou presidente da Petrobras. Com uma
campanha milionária comandada por João Santana, bancada por montanhas
de recursos não contabilizados arrecadados pelo nosso Delúbio, e Lula
com 85% de popularidade animando os palanques, massacraria Serra no
primeiro turno e subiria a rampa do Planalto nos braços do povo, com o
grito de guerra ecoando na Esplanada: "Dirceu guerreiro/ do povo
brasileiro." Ufa! A Jefferson também devemos a criação do termo
"mensalão". Ele sabia que os pagamentos não eram mensais, mas a
periodicidade era irrelevante. O importante era o dinheirão. Foi o seu
instinto marqueteiro que o levou a cunhar o histórico apelido que
popularizou a Ação Penal 470 e gerou a aviltante condição de
"mensaleiro", que perseguirá para sempre até os eventuais absolvidos.
O que poderia expressar melhor a ideia de uma conspiração para
controlar o Estado com uma base parlamentar comprada com dinheiro
público e sujo? Nem Nizan Guanaes, Duda Mendonça e Washington Olivetto
juntos criariam uma marca mais forte e eficiente. Mas antes de
qualquer motivação política, a explosão do maior escândalo do Brasil
moderno é fruto de um confronto pessoal, movido pelos instintos mais
primitivos, entre Jefferson e Dirceu. Como Nina e Carminha da
política, é a história de uma vingança suicida, uma metáfora da luta
do mal contra o mal, num choque de titãs em que se confundem o épico e
o patético, o trágico e o cômico, a coragem e a vilania. Feitos um
para o outro.
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